Mania de terceirizar a culpa
Mania de terceirizar a culpa

Ao avaliar as dificuldades que enfrentava para atingir as metas de vendas, um executivo resumiu em poucas palavras a causa do desalento: “Não é possível competir com um concorrente que oferece preços irreais, baseados em práticas comerciais duvidosas. Isso não se sustenta. Em breve, ele quebrará e ocuparemos nosso espaço por direito.”

Hoje, o mesmo dirigente que desqualificava o concorrente é obrigado a assistir ao crescimento da empresa que trilhava por caminhos incertos, digerir as avaliações equivocadas e correr atrás do prejuízo para evitar a própria ruína. Ou seja, sofre as consequências da fuga da autoavaliação.

Trata-se de um caso típico de terceirização da culpa: a transferência das deficiências internas por meio da auditoria por suposição da concorrência. Em vez de focar energia, talento e inteligência comercial na análise dos próprios processos, ainda há empresas que se dedicam à criação de cenários negativos sobre seus concorrentes.

Como dizia Pirandello, “perdem o contato com o chão e, consequentemente, a consciência de suas próprias estaturas, deixando espaço para que o outro crie corpo a cada dia”. É mais fácil buscar justificativas externas, elegendo um alvo que incomoda e afasta da realidade.

Hoje, o que vende não são, necessariamente, os preços mais baixos, mas sim os melhores preços. Ou seja, aqueles gerados pela precisão da abordagem comercial, pela estratégia de posicionamento no mercado, pela leitura correta das necessidades do cliente e pelo diferencial nos serviços e na qualidade.

Enfim, trata-se de uma gestão inovadora, ousada, competente e lúcida dos negócios. Uma postura que mantém, há décadas, a liderança de diversos produtos e marcas, a despeito dos preços praticados. Henry Ford já ensinava que qualquer um sabe se queixar, afirmando que “não devemos encontrar defeitos, mas soluções”. Entre essas soluções, acredito que está a criação de antídotos à política de competir apenas por preço.

O verdadeiro caminho está em avaliar nos outros as qualidades que possam ter e procurar em nós os defeitos que, certamente, temos. A prática desse conceito, ensinado por Benjamin Franklin, pode nos levar a uma reavaliação constante de nossas escolhas e decisões, o que nos torna capazes de ir além.

Nossos antídotos estão em aproveitar o talento de nossas lideranças para competir por meio dos diferenciais estratégicos, da inovação, da qualificação dos serviços e do equilíbrio do portfólio. Apenas assim utilizaremos a crítica ao outro de maneira positiva e produtiva, e não como um imposto que nossas deficiências cobram do mérito alheio.

Denis Mello

Diretor Nexion Executive Education