Navegar é preciso

O Titanic era um navio que reunia o melhor do luxo e da tecnologia que o espírito humano pôde empreender. Era, acima de tudo, um brinde ao século XX, que se iniciava com todo esplendor. O RMS Titanic nasceu, em 1912, do sonho e da ambição dos homens, ingredientes que levam empreendedores a lançar empresas vencedoras todos os anos, nos quatro cantos do planeta. Para pilotar um navio ou dirigir uma empresa, é preciso coragem e preparo para assumir o comando. Para alcançar um objetivo ou destino, é fundamental traçar cuidadosamente a rota. Também é necessário estar pronto para turbulências durante a viagem, assim como para manobras de emergência.

O iceberg que afundou o Titanic é um fenômeno natural muito comum naquela região, especialmente quando ocorrem mudanças de temperatura que fazem grandes placas de gelo se desprenderem dos maciços. Mas o que fez especificamente aquele iceberg se tornar o mais famoso da história? O fato de ele, ao contrário de todos os outros, ter sido ignorado. Do telegrafista ao capitão, todos tinham conhecimento da presença de formações geladas na área, mas ninguém deu a devida importância ao risco. O próprio telegrafista recebeu seis mensagens sobre o perigo iminente, mas estava ocupado enviando comunicações dos passageiros para seus parentes. Já o comandante estava concentrado em fazer o Titanic chegar ao destino um dia antes da data prevista.

A falta de foco e a inversão de prioridades conduziram o Titanic à colisão com o bloco de gelo, transformando-o em uma das maiores catástrofes marítimas da história, com a morte de mais de 1.500 pessoas.

Esse mesmo desvio de foco pode arrastar empresas em direção a “icebergs” que, apesar de insistentemente sinalizados, acabam ignorados devido à desarmonia entre os condutores.

A história é testemunha do crescente número de empresas que perderam o rumo devido a desentendimentos entre sócios. Discórdias entre os donos de uma organização funcionam como ferrugem, corroendo o casco da empresa de forma lenta e silenciosa. Dividem a equipe, criam facções internas, fragilizam a estrutura e, ao menor impacto, levam a organização ao naufrágio.

Existe uma grande diferença entre o debate e a discussão. O debate saudável, focado nas necessidades da organização, deve ser praticado e incentivado. Já a discussão, que nos afasta do foco e cria feudos internos, deve ser evitada. Debater é fundamental para avaliar cenários e corrigir rotas, inclusive para decidir se aquele destino ainda é o correto, se é hora de aumentar a velocidade, checar as previsões do tempo ou conferir as provisões para a viagem. Discutir, por outro lado, é permitir a instalação de lados opostos, buscando apenas a prevalência de um ponto de vista, embaralhando as coordenadas e conduzindo a empresa para áreas turbulentas. O debate é construtivo. A discussão é destrutiva. Do debate nasce a solução. Da discussão nasce o ressentimento.

Para que a empresa seja um porto seguro, é preciso resgatar a visão de integração e manter o foco na perpetuação do negócio. O bom senso deve ser o norte na difícil viagem da convivência diária. Pensando no bem da organização, é hora de deixar para trás questões pessoais, feridas não cicatrizadas, disputas de poder, vaidades, teimosias e conflitos que possam colocar a embarcação à deriva. Afinal, como já entoou Fernando Pessoa, “navegar é preciso”. A frase carrega dois sentidos importantes para o executivo: precisão e necessidade.

Denis Mello

Diretor Nexion Executive Education